terça-feira, 30 de novembro de 2021

Enquanto Lia Ode Marítima

Encontrava-se vazia a casa...
E eu sentado à mesa de cartas,
pondo-me a ler Fernando Pessoa...
e em mãos o poema, Ode marítima:
"Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de verão,
olho pro lado da Barra,olho pro indefinido,
olho e contenta-me ver,
pequeno, negro e claro, um paquete..."
Leio-o, 
Leio-o bem atentamente...
Leio-o,
e todos os meus sentidos
Mergulham nos versos de Pessoa...
Imagino a nau, 
as velas pandas, 
O cais deserto, 
O marinheiro
E o mar Português...
Imagino a figura franzina do poeta, 
debruçado sobre o papel, 
sob à lamparina,
manuseando a pena, 
esculpindo a história...
Segundos depois,
(concentração absoluta...)
Temporal desaba!
A casa encontrava-se com todas às portas 
e janelas abertas...
(A viagem da nau e do mar de Pessoa, não me permitiu perceber, que chovia e que a casa estava escancarada...)
Lá fora,
um vento forte uivava,
como se fosse a voz do poeta recitando em meus ouvidos,
e nesse momento,
o estrondo da chuva 
e a rajada de vento,
foi por mim completamente ignorados, por causa da surdez momentânea e instantânea gerada pela leitura...
Acordo do poema,
e por fim,
de mim,
olho à frente,
e percebo que a casa transformara-se no mar de Pessoa...
Fecho o livro num susto,
levanto-me da mesa de cartas,
e rapidamente cerro todas as janelas e portas da casa,
deixando a nau lá fora...
Mas o mar invade completamente o meu lar, 
Completamente o meu ser,
tomando tudo...
O cenário do poeta ilustra-me perfeitamente...
É como se eu, 
a realidade,
a poesia 
e a fantasia, 
estivéssemos eternamente misturados...
E é como se viajássemos,
navegássemos sempre juntos,
numa enorme aventura da literatura...